segunda-feira, 8 de dezembro de 2014

Toda criança faz manha... Até as francesas


As mães francesas viraram um mito no Brasil depois do sucesso do livro “Crianças francesas não fazem manha” (Fontanar), escrito pela jornalista americana Pamela Druckerman. Mães brasileiras, sobretudo as de primeira viagem, devoraram o best-seller como se os pais do país europeu soubessem todos os segredos para ensinar um bebê a dormir a noite toda e uma criança a se sentar comportada à mesa. Eis que a psicoterapeuta francesa Isabelle Filliozat, criadora da Escola de Inteligência Emocional e Relacional, decreta que toda criança faz pirraça e que este, na verdade, é seu modo de se expressar. Ela defende a tese no livro “Já tentei de tudo” (Sextante), que acaba de ser lançado no Brasil e ensina como lidar com birras, manhas e ataques de raiva de crianças de 1 a 5 anos.

O que é a pirraça?

É uma reação de estresse. O cérebro está sobrecarregado com excesso de estímulos. A criança não tem mais energia e não tem mais como cooperar. Seu neurônio motor queima, indo em todas as direções. É como uma tempestade no cérebro. É a solução que o cérebro dela encontra para liberar as tensões. A birra pode ser ativada por uma frustração, mas essa última frustração é apenas o gatilho, não a causa. Quando o leite está fervendo, ele transborda, não adianta tampar. Melhor ir direto na causa: desligar o fogo. É o que acontece com a birra.

O que fazer quando seu filho faz aquela clássica pirraça num shopping, quando os pais têm vontade de sumir?

Primeiro respire. E direcione seu olhar para longe das pessoas, para impedir qualquer julgamento. Esse é um cuidado que temos que ter conosco. Em seguida, leve a criança para fora, um estacionamento, por exemplo, e a abrace com carinho.

É possível dar fim à birra?

Em primeiro lugar, não podemos estimular a birra. Não devemos deixá-los esgotados, levá-los a lugares com excesso de estímulos (shoppings). Depois da escola, é sempre bom ir para uma praça ou um playground, onde possam correr livremente. Dê sempre bastante água para que seus neurônios fiquem irrigados, faça uma alimentação saudável (açúcar, creme de leite e certos aditivos podem desencadear acessos de raiva).

Qual a importância de estimular a produção de hormônios como a oxitocina?

A oxitocina ajuda a criança a se sentir feliz, calma, bem. Ajuda a equilibrar a adrenalina e o cortisol, os hormônios do estresse. Podemos estimular sua produção ao beijar, tocar, massagear, dizer palavras de carinho, olhar com atenção. Mas ela não é o único hormônio bom para o comportamento da criança. Podemos estimular também a dopamina (alegria) e a serotonina (calma, harmonia).

Muitas mães brasileiras leram “Crianças francesas não fazem manha” e acreditaram que os pais francesas são seres evoluídos. O que achou do livro?

Não li ainda. Mas não podemos generalizar. Crianças francesas fazem manha, sim, e muitas mães entram nesse jogo de poder. A maioria dos pais franceses é autoritária, o que é muito pouco eficaz. Todos os pais têm uma tendência a olhar para os outros pais e se comparar. Eles se questionam como o outro é capaz de gerenciar os problemas de forma tão melhor. A verdade é que é muito difícil ser pai e mãe.

Os pais hoje dão mais atenção aos smartphones que aos filhos?

Sempre espero que os pais não deem mais atenção aos seus smartphones do que aos próprios filhos, mas muitas crianças não veem desse jeito. Se, durante a brincadeira, você atende o telefone, elas pensam exatamente isso: sentem-se substituídas. Precisamos de um brecha que seja ao longo do dia para nos dedicarmos totalmente aos nossos filhos — se possível, uma hora e meia de atenção exclusiva. Um estudo mostrou que 30 minutos de brincadeira por dia irão reduzir consideravelmente o nível de cortisol (hormônio do estresse) no sangue da criança.

Se fosse dar apenas um conselho aos pais, qual seria?

Seriam dois. O primeiro é: oamor não é uma recompensa, é combustível. O segundo é: em vez de dar uma ordem, faça uma pergunta. Exemplo: “Como está o tempo hoje? Qual sapato podemos botar?”. Funciona melhor do que dizer: “Coloque suas botas”.

Por: O Globo

Nenhum comentário:

Postar um comentário